sábado, 13 de junho de 2009

Análise do Sermão da Sexagésima

O sermão da Sexagésima foi pregado na Capela Real localizada em Lisboa, em março de 1655. Este versa sobre a arte de pregar, apresentando uma teoria inspirada no movimento conceptista, apesar de conter em seu próprio corpo elementos cultistas.
Exerce o papel de prólogo em relação às outras em uma série de quinze volumes de peças oratórias produzidas pelo autor, que ainda afirma no texto do próprio sermão que este: “Servirá como de prólogo aos sermões que vos hei-de pregar, e aos mais que ouvirdes esta Quaresma.”[1]
O tema é retirado de S. Lucas, VIII, 2 e todo o sermão é construído e costurado em torno deste versículo bíblico que diz Semen est verbun Dei, ou seja, a semente é a palavra de Deus. É a partir desta pequena passagem que o pregador desenvolve a metáfora que será matéria da pregação gerando o circuito alegórico da peça oratória que o autor apresenta por meio da pergunta retórica: “Pois se a palavra de Deus é tão poderosa, se a palavra de Deus tem hoje tantos pregadores, por que não vemos hoje nenhum fruto da palavra de Deus?”[2]
O sermão, por versar sobre a arte do pregar, trazendo a teoria sobre o pregar que o autor defendia e utilizava, apresenta as características de oratória vieiriana, podendo-se extrair dele as características de sua parenética.
Como orientações de sua Parênese tem-se que a palavra de Deus gera o sermão, isto é, instaura a prédica fazendo com que todo o sermão tenha como fonte e tema a palavra divina; a palavra de Deus é também responsável pela persuasão, é eficaz e incontestável argumento ao sermão que se desenvolve permeado por citações bíblicas diretas e indiretas que lhe conferem autoridade e funcionam como base de prova e argumentação, por meio de correspondência alegórica e analógica. A palavra sagrada sugere ainda o desencadeamento metafórico da argumentação que reside fundamentalmente na Sagrada Escritura.
A prédica encarna o Ser divino, figura-o, quer se tornar a imagem de Deus através da metáfora do semeador e da estrutura motivada do sermão. Vieira equipara o semear ao pregar fazendo com que o pregador se torne a personificação do Verbo Divino, ou seja, torna-se o “Ventríloquo de Deus”[3] conforme o intitula samiR savoN.
O Sermão apresenta uma estrutura motivada que remete ao seu tema, Vieira prega como se realizasse uma “semeadura de palavras”: semeia cinco circunstâncias (teses) e por meio da negação as recolhe (antíteses) para obter o fruto (tese), sua estrutura constrói círculos concêntricos obtidos através de recursos como a anáfora, disseminação e recolha, intentando igualar-se a própria imagem de Deus, dizendo-se imagem e semelhança do criador:

“Deus fez-me à sua imagem e semelhança
dotou-me se sua ciência e segredos.”[4]

Ainda a respeito de suas orientações, tem-se que o Sermão fundamenta a escatologia mítico-profética de suas congeminações históricas, sendo que seu tom profético se faz presente nas digressões acerca do período temporal, apresentando o presente como futuro do passado e passado do futuro, visão esta que é “sua chave de profeta[5]” conforme aponta o poeta samiR savoN.
[1] VIEIRA, Antônio, Sermão da Sexagésima, in: SILVEIRA, F. M. . Literatura barroca. , São Paulo: Global, 1987. p.61
[2] Idem; ibidem; p.
[3] SILVEIRA, Francisco Maciel. Palimpsestos: uma história intertextual da Literatura Portuguesa. 2ª ed. , São Paulo, Paulistana, 2008. p. 16
[4] SILVEIRA, Francisco Maciel. Palimpsestos: uma história intertextual da Literatura Portuguesa. 2ª ed. , São Paulo, Paulistana, 2008. p. 17
[5] Idem; ibidem; pg. 16