sábado, 13 de junho de 2009

2. A Retórica aristotélica em Padre Antônio Vieira

Movido pela razão, de que nada se move por si, e por meio de uma análise elaborada, Aristóteles, em sua Retórica resulta em um estudo da linguagem, que seria uma "codificação de preceitos nascidos da experiência com o objetivo de ajudar os outros a exercitarem-se corretamente nas técnicas de persuasão" [1]. Também chamada de Retórica Antiga, a Retórica é uma disciplina, que tem por objetivo persuadir um auditório a aceitar uma das opiniões a respeito da questão que se discute, pode-se dizer, portanto, que a Retórica é uma teoria do discurso persuasivo.

A filosofia aristotélica teve entrada no Ocidente por influência árabe, e passou a ser objeto de estudo em Universidades e mosteiros. Dessa forma, foi possível que intelectuais da Idade Média, apesar de negarem as invenções tecnológicas, estudassem a fundo teologia e filosofia. Os estudos acerca do discurso oral, deixados por Aristóteles, do campo jurídico ao religioso, teriam sido de conhecimento de Sto. Tomás, em meados do século XIV, e fizeram parte dos fundamentos de sua "Escolástica", de base aristotélica, que conseguiu conciliar a fé e a razão, de modo que a filosofia serviria à fé.

A "Escolástica" tomista veio a influenciar a Cia. de Jesus nos séculos XVI e XVII, e como tal, reminiscentes estudos sobre a obra aristotélica. Isso nos faz pensar que a Retórica aristotélica tenha sido influência para a forma da escrita e da composição de grande parte de discursos datados entre os séculos de transição da era. Antônio Vieira, como membro da Cia. de Jesus, provavelmente teve como parte de seus estudos os princípios de base aristotélica.

Dentro do objetivo da Retórica, que é persuadir o público, Antônio Vieira constrói seus Sermões. Segundo Dante Tringali [2], persuadir envolve vários aspectos e superpõe-se três níveis de persuasão: convencer, comover e agradar, que são os tria officia, as três funções retóricas.

"Etimológicamente, persuadir vem de per+suadere; per é um prefixo que significa "por completo" e suadere deriva da raiz suadv ; da mesma família de "suavis = suave". Persuadere = aconselhar, levar alguém aceitar um ponto de vista de modo suave, sem obstáculos. " [3]
Convencer: cum + vincere, isto é, vencer o opositor com a participação dele. Convencer tecnicamente quer dizer persuadir a mente através de argumentos lógicos. O convencer implica o docere = doutrinar , doutrina-se para persuadir.

Comover: em latim cum + movere , comover , vem a ser persuadir o coração através dos afetos : sentimentos , emoções, paixões. Perturba-se a mente do ouvinte através da afetividade, graças à qual, a vontade arrasta a mente.

Agradar : placere, delectare , agradar, deleitar denotam o prazer estético que o discurso deve suscitar, o orador deve agradar o gosto do ouvinte, agrada-se sobretudo pelo estilo. Mas não se trata de agradar por agradar, senão com o intuito de persuadir.

Como já foi visto, diversos fatores acerca do contexto histórico e características do Barroco estariam presente no Sermão, e a forma retórica, na intenção de convencer, comover e agradar um público já quase descrente na Igreja Católica, seria um instrumento habilmente usado por Vieira. Aliás, contestado pelo Tribunal do Santo Ofício, seu modo de pregar consistia na apresentação de fatores que de fato iam contra o alto clero, Vieira preocupava-se em chamar a atenção de seu público - "olhos e ouvidos de ver".



[1] ALEXANDRE JÚNIOR, Manuel ; "Introdução"; in ARISTÓTELES; Retórica; Lisboa; Ed. Imprensa Nacional- Casa da Moeda; 1998; p 12.
[2] TRINGALI, Dante; "Introdução às Retóricas" ; Araraquara; Departamento de Literatura, Instituto de Letras, Ciências Sociais e Educação - Universidade Estadual Paulista- UNESP ; 1984 ; pp 19.

[3] 3. TRINGALI, Dante; "Introdução às Retóricas" ; Araraquara; Departamento de Literatura, Instituto de Letras, Ciências Sociais e Educação - Universidade Estadual Paulista- UNESP ; 1984 ; PP. 26-28